Vou cantar num canto de primeiro As coisas lá da minha mudernagem Que me fizeram errante e violeiro Eu falo sério e não é vadiagem É pra você que agora está me ouvindo Eu juro inté pelo santo menino Virgem Maria que ouve o que eu digo Se for mentira que me mande um castigo Ia pois pro cantador e violeiro Só há três coisas nesse mundo vão Amor, forria, viola, nunca dinheiro Viola, forria, amor, dinheiro não Cantador de trovas e martelos De gabinetes, ligeira e mourão Ai cantador corri o mundo inteiro Já inté cantei nas portas de um castelo De um rei que se chamava João Pode acreditar meu companheiro A dispois de eu ter cantado o dia inteiro O rei me disse fica Eu disse não Se eu tivesse de viver obrigado Um dia e antes desse dia eu morro Deus fez os homens e os bichos tudo forro Já havia escrito no livro sagrado Que a vida nessa terra é uma passagem Cada um leva um fardo pesado É o ensinamento que desde a mudernagem Eu trago dentro do coração guardado Tive muita dor de não ter nada Pensando que nesse mundo é tudo ter Mas só depois de penar pelas estradas Beleza na pobreza é que fui ver Fui ver na procissão louvado seja Mal assombro das casas abandonadas Coro de cegos nas portas das igrejas E o ermo da solidão nas estradas Pispiando tudo do começo Eu vou mostrar como se faz um pachola Que enforca o pescoço da viola E revira toda moda pelo avesso Sem reparar sequer se é noite e dia Vai hoje cantar o bem da forria Sem um tostão na cuia do cantador Canta até morrer o bem do amor